As novas
ações midiáticas patrocinadas pela juristocracia tupiniquim (desta vez tendo à
frente um pupilo da tresloucada autora do pedido de impeachment), recolocam
no debate a questão acerca dos maiores interessados no golpe, esse estupro à
democracia brasileira. Cada vez fica mais claro que, para além dos pastelões,
corruptos e fanfarrões que abundam no Congresso e no governo interino, os
verdadeiros interessados no imediato retorno de nosso país à velha categoria
das repúblicas das bananas são os ricos e poderosos. Por isso, é
fundamental entendermos o que está por detrás do jogo jogado do impeachment fajuto.
Giorgio
Agamben, um dos
principais intelectuais contemporâneos, professor em diversas universidades
europeias e norte-americanas explicou, em entrevista recente (leia na
íntegra, aqui), como funciona a atual fase do capitalismo
(concentrador de riqueza, fundamentalmente rentista e excludente, que move
todos os interesses, inclusive a determinar os rumos da política e da vida das
pessoas). Agamben foi definido pelo Times e pelo Le
Monde como uma das dez mais importantes cabeças pensantes do mundo.
Sua obra, influenciada por Michel Foucault e Hannah Arendt, centra-se nas
relações entre filosofia, literatura, poesia e, fundamentalmente, política.
Quando
lemos com atenção algumas considerações de Agamben sobre a democracia, por
exemplo, entendemos com mais clareza o que está por detrás de afrontas à
cidadania em várias partes do mundo, como o golpe em curso no país. Para ele,
“a nova ordem do poder mundial funda-se sobre um modelo de governabilidade que
se define como democrática, mas que nada tem a ver com o que este termo
significava em Atenas”.
Para
manter um empreendimento dito democrático e que, paradoxalmente, produz imensa
concentração de renda e riqueza nas mãos do 1% mais ricos em detrimento à
dignidade da absoluta maioria das pessoas, o capitalismo, atualmente, sobrevive
da fabricação de crises: “Crise e economia atualmente não são usadas como
conceitos, mas como palavras de ordem, que servem para impor e para fazer com
que se aceitem medidas e restrições que as pessoas não têm motivo algum para
aceitar. “Crise” hoje em dia significa simplesmente “você deve obedecer!
”.
Neste
sentido, explica Agamben, “é preciso tomar ao pé da letra a ideia
de Walter Benjamin, segundo o qual o capitalismo é, realmente, uma
religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que jamais existiu,
porque não conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um culto ininterrupto
cuja liturgia é o trabalho e cujo objeto é o dinheiro. Deus não
morreu, ele se tornou dinheiro. ”
Nos dizeres
do professor Ladislau Dowbor, "a expansão dos lobbies, a
compra dos políticos, a invasão do judiciário, o controle dos sistemas de
informação da sociedade e a manipulação do ensino acadêmico representam alguns
dos instrumentos mais importantes da captura do poder político geral pelas
grandes corporações. Mas o conjunto destes instrumentos leva em última
instância a um mecanismo mais poderoso que os articula e lhe confere caráter
sistêmico: a apropriação dos próprios resultados da atividade econômica, por
meio do controle financeiro em pouquíssimas mãos."
Ademais,
a associação entre os grandes oligopólios do capitalismo internacional com a
manipulação da mídia, serviçal desses grupos, naturaliza todo o tipo de
violência real e simbólica contra a democracia: “É mais simples
manipular a opinião das pessoas através da mídia e da televisão do que dever
impor em cada oportunidade as próprias decisões com a violência. ”
No caso
brasileiro, a liturgia formal do voto popular deixou de ser um “esquema” a
beneficiar os históricos usurpadores das riquezas e do trabalho nacionais e,
assim sendo, não mais interessa aos donos do deus-dinheiro respeitar as regras
procedimentais da democracia. O resultado eleitoral pode, portanto, ser anulado
com desculpas das mais esfarrapadas. Os capachos tupiniquins do grande sistema
de corrupção internacional que move o capitalismo atualmente resolveram jogar
no lixo as deliberações eleitorais para tocarem um impeachment sem
crime de responsabilidade. O que é isso? Simples: é golpe.
Essa
percepção acerca do estupro à nossa democracia parece se tornar cada vez mais
clara. Mesmo não apreciando certo culturalismo dependente que gosta de bajular
as “inteligências” alienígenas como se fossem melhores que a produção da
reflexão autóctone, é digno de destaque o fato de, nesta semana, intelectuais
de referência em todo o mundo, como os filósofos alemães Jürgen Habermas, Axel
Honneth e Rainer Forst, a filósofa norte-americana Nancy Fraser e o filósofo
canadense Charles Taylor terem assinado um manifesto internacional de repúdio
ao que classificaram como “golpe branco” contra a democracia brasileira.
Expressão também já utilizada, mais de uma vez, pelo Papa Francisco.
(Veja aqui >>>).
Segundo o
manifesto internacional, a oposição no Brasil, formada por partidos de
direita, aproveitou-se da crise econômica para levar adiante uma campanha
“violenta” contra um governo eleito democraticamente. Por isso, o
objetivo do impeachment da presidenta Dilma Rousseff é atacar
direitos sociais, desregulamentar a economia e frear as investigações de
corrupção.
Noutro
documento, com mais de mil assinaturas, artistas e intelectuais estrangeiros
também manifestaram solidariedade ao Brasil. O texto diz que os
movimentos sociais “estão sujeitos a uma ofensiva política de grande magnitude
que leva o Brasil a um período de grande retrocesso democrático” e obscuridade.
Talvez,
pelo fato de ameaçar a hegemonia dos donos do capital especulativo e rentista
não somente daqui, mas do mundo (haja vista as potencialidades nacionais, como
nossas reservas de petróleo e a biodiversidade – ativos valiosíssimos no
presente e no futuro), a caçada ao PT voltou com toda a força nesta semana.
Curiosamente, depois de uma reunião entre a ninfa justiceira e um ministro
interino e, para o delírio dos moralistas sem moral, foram retomados mais uma
vez os espetáculos policialesco-midiático-seletivos. Incrivelmente, logo após a
divulgação de dezenas de áudios a comprovarem a corrupção endêmica e sistêmica
envolvendo o PMDB, o PSDB e o DEM há anos, nestas plagas. A justiça brasileira
é uma bênção para os homens e as mulheres de ben$, com cifrão no final.
Não serei
eu a defender Paulo Bernardo e ninguém que, eventualmente, tenha praticado atos
de corrupção. Mas, até para um idiota político valem as perguntas: alguém já
viu ou ouviu falar que a polícia (política) federal tenha vasculhado as sedes
nacionais de partidos inúmeras vezes citados em casos de corrupção como o PSDB,
DEM, PP, PMDB? Alguém conhece pelo menos um tesoureiro nacional desses partidos
que tenha sido investigado? Quantos ministros do governo FHC, flagrados em
escutas comprometedoras em diferentes ocasiões, foram conduzidos à prisão,
tiveram condução coercitiva ou prestaram depoimentos (cobertos ao vivo pela
mídia?) Em síntese: a juristocracia seletiva tupiniquim faz com que o Tomás de
Torquemada, no túmulo, sinta-se apequenado.
O fato é
que, como nenhum partido conseguiu ganhar quatro eleições seguidas para a
Presidência em toda história republicana brasileira (e, não obstante o massacre
midiático-justiceiro contra o ex-presidente Lula, uma liderança que continua
firme numa provável disputa presidencial futura), o PT ainda é um perigo real e
simbólico aos donos do capital internacional e seus capachos daqui e, portanto,
deverá ser aniquilado. E o primeiro passo, dado o fracasso da cavalar campanha
midiática contra o partido, é consolidar a empreitada golpista.
Os
gigolôs do capitalismo rentista, sacerdotes e sacerdotisas do deus-dinheiro, e
seus prepostos das coalizões que articulam o golpe nessas plagas (veja aqui >>>) querem manter o país como eterna
colônia. E farão de tudo para trucidar quaisquer pessoas e grupos que se
opuserem aos seus intentos.
Robson Sávio Reis Souza
Doutor em Ciências
Sociais e professor da PUC Minas.
Texto1: "Deus não morreu. Ele tornou-se Dinheiro". Entrevista com Giorgio Agamben
"O capitalismo é uma religião, e a mais feroz, implacável e
irracional religião que jamais existiu, porque não conhece nem redenção nem
trégua. Ela celebra um culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e cujo
objeto é o dinheiro", afirma Giorgio Agamben, em entrevista concedida a
Peppe Salvà e publicada por Ragusa News, 16-08-2012.
Giorgio Agamben é um dos maiores filósofos vivos. Amigo de Pasolini
e de Heidegger, Giorgio Agamben foi
definido pelo Times e por Le Monde como uma
das dez mais importantes cabeças pensantes do mundo. Pelo segundo ano
consecutivo ele transcorreu um longo período de férias em Scicli,
na Sicília, Itália, onde concedeu a entrevista.
Segundo ele, "a nova ordem do poder mundial funda-se sobre um modelo de
governamentalidade que se define como democrática, mas que nada tem a ver com o
que este termo significava em Atenas". Assim, "a
tarefa que nos espera consiste em pensar integralmente, de cabo a cabo,
aquilo que até agora havíamos definido com a expressão, de resto pouco clara em
si mesma, “vida política”, afima Agamben.
A tradução é de Selvino J. Assmann, professor de
Filosofia do Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Santa
Catarina - UFSC.
Eis a entrevista.
O governo Monti invoca a crise e o estado de necessidade, e parece
ser a única saída tanto da catástrofe financeira quanto das formas
indecentes que o poder havia assumido na Itáli. A convocação de Monti era a
única saída, ou poderia, pelo contrário, servir de pretexto para impor uma séria
limitação às liberdades democráticas?
“Crise” e “economia” atualmente não são usadas como conceitos, mas como palavras de ordem, que servem para impor e para fazer com que se aceitem medidas e restrições que as pessoas não têm motivo algum para aceitar. ”Crise” hoje em dia significa simplesmente “você deve obedecer!”. Creio que seja evidente para todos que a chamada “crise” já dura decênios e nada mais é senão o modo normal como funciona o capitalismo em nosso tempo. E se trata de um funcionamento que nada tem de racional.
“Crise” e “economia” atualmente não são usadas como conceitos, mas como palavras de ordem, que servem para impor e para fazer com que se aceitem medidas e restrições que as pessoas não têm motivo algum para aceitar. ”Crise” hoje em dia significa simplesmente “você deve obedecer!”. Creio que seja evidente para todos que a chamada “crise” já dura decênios e nada mais é senão o modo normal como funciona o capitalismo em nosso tempo. E se trata de um funcionamento que nada tem de racional.
Para entendermos o que está acontecendo, é preciso tomar ao pé da letra a
idéia de Walter Benjamin, segundo o qual o capitalismo é,
realmente, uma religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que
jamais existiu, porque não conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um
culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e cujo objeto é o dinheiro.
Deus não morreu, ele se tornou Dinheiro. O Banco – com os seus cinzentos
funcionários e especialistas - assumiu o lugar da Igreja e dos seus
padres e, governando o crédito (até mesmo o crédito dos Estados, que docilmente
abdicaram de sua soberania ), manipula e gere a fé – a escassa, incerta
confiança – que o nosso tempo ainda traz consigo. Além disso, o fato de o
capitalismo ser hoje uma religião, nada o mostra melhor do que o titulo de um
grande jornal nacional (italiano) de alguns dias atrás: “salvar o euro a
qualquer preço”. Isso mesmo, “salvar” é um termo religioso, mas o que significa
“a qualquer preço”? Até ao preço de “sacrificar” vidas humanas? Só numa
perspectiva religiosa (ou melhor, pseudo-religiosa) podem ser feitas afirmações
tão evidentemente absurdas e desumanas.
A crise econômica que ameaça levar consigo parte dos Estados
europeus pode ser vista como condição de crise de toda a modernidade?
A crise atravessada pela Europa não é apenas um problema econômico, como se
gostaria que fosse vista, mas é antes de mais nada uma crise da relação com o
passado. O conhecimento do passado é o único caminho de acesso ao presente. É
procurando compreender o presente que os seres humanos – pelo menos nós,
europeus – são obrigados a interrogar o passado. Eu disse “nós,
europeus”, pois me parece que, se admitirmos que a palavra “Europa” tenha um
sentido, ele, como hoje aparece como evidente, não pode ser nem
político, nem religioso e menos ainda econômico, mas talvez consista
nisso, no fato de que o homem europeu – à diferença, por exemplo, dos
asiáticos e dos americanos, para quem a história e o passado tem um
significado completamente diferente – pode ter acesso à sua verdade unicamente
através de um confronto com o passado, unicamente fazendo as contas com a sua
história.
O passado não é, pois, apenas um patrimônio de bens e de tradições, de
memórias e de saberes, mas também e sobretudo um componente antropológico
essencial do homem europeu, que só pode ter acesso ao presente olhando, de cada
vez, para o que ele foi. Daí nasce a relação especial que os países
europeus (a Itália, ou melhor, a Sicília, sob
este ponto de vista é exemplar) têm com relação às suas cidades, às suas
obras de arte, à sua paisagem: não se trata de conservar bens mais ou menos
preciosos, entretanto exteriores e disponíveis; trata-se, isso sim, da
própria realidade da Europa, da sua indisponível sobrevivência. Neste sentido,
ao destruírem, com o cimento, com as autopistas e a Alta Velocidade, a
paisagem italiana, os especuladores não nos privam apenas de um bem, mas
destroem a nossa própria identidade. A própria expressão “bens culturais” é
enganadora, pois sugere que se trata de bens entre outros bens, que podem ser
desfrutados economicamente e talvez vendidos, como se fosse possível liquidar e
por à venda a própria identidade.
Há muitos anos, um filósofo que também era um alto funcionário da Europa
nascente, Alexandre Kojève, afirmava que o homo sapiens
havia chegado ao fim de sua história e já não tinha nada diante de si a
não ser duas possibilidades: o acesso a uma animalidade pós-histórica
(encarnado pela american way of life) ou o esnobismo (encarnado pelos
japoneses, que continuavam a celebrar as suas cerimônias do chá, esvaziadas,
porém, de qualquer significado histórico). Entre uma América do Norte
integralmente re-animalizada e um Japão que só se mantém
humano ao preço de renunciar a todo conteúdo histórico, a Europa poderia
oferecer a alternativa de uma cultura que continua sendo humana e vital, mesmo
depois do fim da história, porque é capaz de confrontar-se com a sua própria
história na sua totalidade e capaz de alcançar, a partir deste confronto, uma
nova vida.
A sua obra mais conhecida, Homo Sacer, pergunta pela relação entre poder político e vida nua, e evidencia as dificuldades presentes nos dois termos. Qual é o ponto de mediação possível entre os dois pólos?
A sua obra mais conhecida, Homo Sacer, pergunta pela relação entre poder político e vida nua, e evidencia as dificuldades presentes nos dois termos. Qual é o ponto de mediação possível entre os dois pólos?
Minhas investigações mostraram que o poder soberano se fundamenta, desde a
sua origem, na separação entre vida nua (a vida biológica, que, na Grécia,
encontrava seu lugar na casa) e vida politicamente qualificada (que tinha seu
lugar na cidade). A vida nua foi excluída da política e, ao mesmo tempo,
foi incluída e capturada através da sua exclusão. Neste sentido, a vida nua é o
fundamento negativo do poder. Tal separação atinge sua forma extrema na
biopolítica moderna, na qual o cuidado e a decisão sobre a vida nua se tornam
aquilo que está em jogo na política. O que aconteceu nos estados
totalitários do século XX reside no fato de que é o poder (também na
forma da ciência) que decide, em última análise, sobre o que é uma vida
humana e sobre o que ela não é. Contra isso, se trata de pensar numa política
das formas de vida, a saber, de uma vida que nunca seja separável da sua forma,
que jamais seja vida nua.
O mal-estar, para usar um eufemismo, com que o ser humano comum se põe frente ao mundo da política tem a ver especificamente com a condição italiana ou é de algum modo inevitável?
Acredito que atualmente estamos frente a um fenômeno novo que vai além do desencanto e da desconfiança recíproca entre os cidadãos e o poder e tem a ver com o planeta inteiro. O que está acontecendo é uma transformação radical das categorias com que estávamos acostumados a pensar a política. A nova ordem do poder mundial funda-se sobre um modelo de governamentalidade que se define como democrática, mas que nada tem a ver com o que este termo significava em Atenas. E que este modelo seja, do ponto de vista do poder, mais econômico e funcional é provado pelo fato de que foi adotado também por aqueles regimes que até poucos anos atrás eram ditaduras. É mais simples manipular a opinião das pessoas através da mídia e da televisão do que dever impor em cada oportunidade as próprias decisões com a violência. As formas da política por nós conhecidas – o Estado nacional, a soberania, a participação democrática, os partidos políticos, o direito internacional – já chegaram ao fim da sua história. Elas continuam vivas como formas vazias, mas a política tem hoje a forma de uma “economia”, a saber, de um governo das coisas e dos seres humanos. A tarefa que nos espera consiste, portanto, em pensar integralmente, de cabo a cabo, aquilo que até agora havíamos definido com a expressão, de resto pouco clara em si mesma, “vida política”.
O estado de exceção, que o senhor vinculou ao conceito de soberania, hoje em dia parece assumir o caráter de normalidade, mas os cidadãos ficam perdidos perante a incerteza na qual vivem cotidianamente. É possível atenuar esta sensação?
Vivemos há decênios num estado de exceção que se tornou regra, exatamente assim como acontece na economia em que a crise se tornou a condição normal. O estado de exceção – que deveria sempre ser limitado no tempo – é, pelo contrário, o modelo normal de governo, e isso precisamente nos estados que se dizem democráticos. Poucos sabem que as normas introduzidas, em matéria de segurança, depois do 11 de setembro (na Itália já se havia começado a partir dos anos de chumbo) são piores do que aquelas que vigoravam sob o fascismo. E os crimes contra a humanidade cometidos durante o nazismo foram possibilitados exatamente pelo fato de Hitler, logo depois que assumiu o poder, ter proclamado um estado de exceção que nunca foi revogado. E certamente ele não dispunha das possibilidades de controle (dados biométricos, videocâmaras, celulares, cartões de crédito) próprias dos estados contemporâneos. Poder-se-ia afirmar hoje que o Estado considera todo cidadão um terrorista virtual. Isso não pode senão piorar e tornar impossível aquela participação na política que deveria definir a democracia. Uma cidade cujas praças e cujas estradas são controladas por videocâmaras não é mais um lugar público: é uma prisão.
A grande autoridade que muitos atribuem a estudiosos que, como o senhor, investigam a natureza do poder político poderá trazer-nos esperanças de que, dizendo-o de forma banal, o futuro será melhor do que o presente?
Otimismo e pessimismo não são categorias úteis para pensar. Como escrevia Marx em carta a Ruge: ”a situação desesperada da época em que vivo me enche de esperança”.
Podemos fazer-lhe uma pergunta sobre a lectio que o senhor deu em Scicli? Houve quem lesse a conclusão que se refere a Piero Guccione como se fosse uma homenagem devida a uma amizade enraizada no tempo, enquanto outros viram nela uma indicação de como sair do xequemate no qual a arte contemporânea está envolvida.
Trata-se de uma homenagem a Piero Guccione e a Scicli, pequena cidade em que moram alguns dos mais importantes pintores vivos. A situação da arte hoje em dia é talvez o lugar exemplar para compreendermos a crise na relação com o passado, de que acabamos de falar. O único lugar em que o passado pode viver é o presente, e se o presente não sente mais o próprio passado como vivo, o museu e a arte, que daquele passado é a figura eminente, se tornam lugares problemáticos. Em uma sociedade que já não sabe o que fazer do seu passado, a arte se encontra premida entre a Cila do museu e a Caribdis da mercadorização. E muitas vezes, como acontece nos templos do absurdo que são os museus de arte contemporânea, as duas coisas coincidem.
O mal-estar, para usar um eufemismo, com que o ser humano comum se põe frente ao mundo da política tem a ver especificamente com a condição italiana ou é de algum modo inevitável?
Acredito que atualmente estamos frente a um fenômeno novo que vai além do desencanto e da desconfiança recíproca entre os cidadãos e o poder e tem a ver com o planeta inteiro. O que está acontecendo é uma transformação radical das categorias com que estávamos acostumados a pensar a política. A nova ordem do poder mundial funda-se sobre um modelo de governamentalidade que se define como democrática, mas que nada tem a ver com o que este termo significava em Atenas. E que este modelo seja, do ponto de vista do poder, mais econômico e funcional é provado pelo fato de que foi adotado também por aqueles regimes que até poucos anos atrás eram ditaduras. É mais simples manipular a opinião das pessoas através da mídia e da televisão do que dever impor em cada oportunidade as próprias decisões com a violência. As formas da política por nós conhecidas – o Estado nacional, a soberania, a participação democrática, os partidos políticos, o direito internacional – já chegaram ao fim da sua história. Elas continuam vivas como formas vazias, mas a política tem hoje a forma de uma “economia”, a saber, de um governo das coisas e dos seres humanos. A tarefa que nos espera consiste, portanto, em pensar integralmente, de cabo a cabo, aquilo que até agora havíamos definido com a expressão, de resto pouco clara em si mesma, “vida política”.
O estado de exceção, que o senhor vinculou ao conceito de soberania, hoje em dia parece assumir o caráter de normalidade, mas os cidadãos ficam perdidos perante a incerteza na qual vivem cotidianamente. É possível atenuar esta sensação?
Vivemos há decênios num estado de exceção que se tornou regra, exatamente assim como acontece na economia em que a crise se tornou a condição normal. O estado de exceção – que deveria sempre ser limitado no tempo – é, pelo contrário, o modelo normal de governo, e isso precisamente nos estados que se dizem democráticos. Poucos sabem que as normas introduzidas, em matéria de segurança, depois do 11 de setembro (na Itália já se havia começado a partir dos anos de chumbo) são piores do que aquelas que vigoravam sob o fascismo. E os crimes contra a humanidade cometidos durante o nazismo foram possibilitados exatamente pelo fato de Hitler, logo depois que assumiu o poder, ter proclamado um estado de exceção que nunca foi revogado. E certamente ele não dispunha das possibilidades de controle (dados biométricos, videocâmaras, celulares, cartões de crédito) próprias dos estados contemporâneos. Poder-se-ia afirmar hoje que o Estado considera todo cidadão um terrorista virtual. Isso não pode senão piorar e tornar impossível aquela participação na política que deveria definir a democracia. Uma cidade cujas praças e cujas estradas são controladas por videocâmaras não é mais um lugar público: é uma prisão.
A grande autoridade que muitos atribuem a estudiosos que, como o senhor, investigam a natureza do poder político poderá trazer-nos esperanças de que, dizendo-o de forma banal, o futuro será melhor do que o presente?
Otimismo e pessimismo não são categorias úteis para pensar. Como escrevia Marx em carta a Ruge: ”a situação desesperada da época em que vivo me enche de esperança”.
Podemos fazer-lhe uma pergunta sobre a lectio que o senhor deu em Scicli? Houve quem lesse a conclusão que se refere a Piero Guccione como se fosse uma homenagem devida a uma amizade enraizada no tempo, enquanto outros viram nela uma indicação de como sair do xequemate no qual a arte contemporânea está envolvida.
Trata-se de uma homenagem a Piero Guccione e a Scicli, pequena cidade em que moram alguns dos mais importantes pintores vivos. A situação da arte hoje em dia é talvez o lugar exemplar para compreendermos a crise na relação com o passado, de que acabamos de falar. O único lugar em que o passado pode viver é o presente, e se o presente não sente mais o próprio passado como vivo, o museu e a arte, que daquele passado é a figura eminente, se tornam lugares problemáticos. Em uma sociedade que já não sabe o que fazer do seu passado, a arte se encontra premida entre a Cila do museu e a Caribdis da mercadorização. E muitas vezes, como acontece nos templos do absurdo que são os museus de arte contemporânea, as duas coisas coincidem.
Duchamp talvez tenha sido o primeiro a dar-se conta do beco
sem saída em que a arte se meteu. O que faz Duchamp quando
inventa o ready-made? Ele toma um objeto de uso qualquer, por
exemplo, um vaso sanitário, e, introduzindo-o num museu, o força a
apresentar-se como obra de arte. Naturalmente - a não ser o breve instante
que dura o efeito do estranhamento e da surpresa – na realidade nada
alcança aqui a presença: nem a obra, pois se trata de um objeto de
uso qualquer, produzido industrialmente, nem a operação artística, porque não
há de forma alguma uma poiesis, produção – e nem sequer o artista,
porque aquele que assina com um irônico nome falso o vaso sanitário não age
como artista, mas, se muito, como filósofo ou crítico, ou, conforme gostava de
dizer Duchamp, como “alguém que respira”, um simples ser vivo.
Em todo caso, certamente ele não queria produzir uma obra de arte, mas
desobstruir o caminhar da arte, fechada entre o museu e a mercadorização.
Vocês sabem: o que de fato aconteceu é que um conluio, infelizmente ainda
ativo, de hábeis especuladores e de “vivos” transformou o ready-made
em obra de arte. E a chamada arte contemporânea nada mais faz do que repetir o
gesto de Duchamp, enchendo com não-obras e performances
a museus, que são meros organismos do mercado, destinados a acelerar a
circulação de mercadorias, que, assim como o dinheiro, já alcançaram o estado
de liquidez e querem ainda valer como obras. Esta é a contradição da arte
contemporânea: abolir a obra e ao mesmo tempo estipular seu preço.
Texto2: “O Papa Francisco se preocupa com a situação política do Brasil. Será que ele está sozinho?
Fotomontagem.
Da esquerda para a direita: Papa Francisco com Esquivel; com Letícia Sabatela
e a juíza Kenarik; com os bispos do CELAM e, finalmente, recebendo o livro
"Resistência ao Golpe")
|
Nos
últimos dois meses, de fontes diversas e confiáveis, ignoradas solenemente pela
mídia golpista, ficamos sabendo da preocupação do Papa Francisco com a situação
política do nosso país. (Aliás, desde o início do ano passado o pontífice já
teria se manifestado várias vezes junto a órgãos da igreja católica no Brasil
acerca de sua apreensão com o desenrolar da crise política e econômica).
No final
de abril, o escritor argentino Adolfo Pérez Esquivel, prêmio nobel da paz em
1980, revelou, em entrevista ao jornalista Darío Pignotti, do jornal Página
12, que levou à presidenta Dilma Rousseff o apoio do Papa Francisco: “o
papa Francisco está muito preocupado com o que está acontecendo no Brasil; tudo
isso vai trazer consequências negativas para toda a região e teremos um grave
retrocesso democrático”.
Ainda,
segundo Esquivel, numa conversa sobre os acontecimentos no Brasil, o Papa
afirmou que o impeachment não passa de um golpe brando. O papa também
teria lhe dito que Dilma é uma mulher honesta, denunciada por corruptos.
Poucos
dias depois, em 9 de maio, a atriz Letícia Sabatella e a juíza Kenarik
Boujikian Felippe participaram de um encontro oficial com o papa Francisco, no
Vaticano. Na ocasião, entregaram a ele uma carta denunciando a ilegalidade do impeachment
da presidenta. A carta foi assinada pelo advogado Marcello Lavenère, membro da
Comissão Justiça e Paz, um organismo ligado a Conferência Nacional de Bispos do
Brasil (CNBB). O texto considera o impedimento de Dilma um “golpe parlamentar
de Estado”, manipulado pela mídia, sem fundamento legal e afirma que essa
conjuntura poderá afetar outros países da América Latina. Na ocasião, o Papa,
novamente, teria expressado inquietação com o desenrolar do processo golpista.
Em 19 de
maio, numa reunião com a presidência do Conselho Episcopal Latino-americano
(CELAM) – órgão colegiado dos bispos de toda a América Latina – o Papa
Francisco, mais uma vez, advertiu que pode estar acontecendo "golpes de estado
suave” em alguns países da região, notadamente se referindo às deposições
arbitrárias de presidentes ocorridas em Honduras, Paraguai e, agora, em curso,
no Brasil. Na ocasião, Francisco expressou sua preocupação com os problemas
sociais dos países da América Latina em geral.
Num
encontro com juízes no Vaticano, nesta sexta, 03 de junho, o Papa Francisco
recebeu um exemplar do livro “A resistência ao golpe de 2016”, das mãos do
procurador de Justiça Rômulo de Andrade Moreira, da Bahia.
Nenhum
dos acontecimentos acima mencionados foram desmentidos pelo Vaticano. Portanto,
podemos concluir que são informações fidedignas.
O Papa
Francisco tem demonstrado, em reiteradas ocasiões, sua angústia em relação a
uma onda direitista e neoliberal que está eliminando em diversos países as
conquistas sociais alcançadas nas últimas décadas. Neste sentido, o Papa tem
advertido com toda a firmeza acerca dos governos serviçais da atual fase do
capitalismo rentista, especulativo e concentrador de riqueza e renda. Trata-se
de um modelo político-econômico da “economia que mata”, do “capital
transformado em ídolo”, da “ambição sem limites do dinheiro que comanda” tudo,
nas palavras do Pontífice. Ora, o governo interino brasileiro encaixa-se
milimetricamente nessa categoria.
Francisco
já deixou claro que “a distribuição justa dos frutos da terra e do trabalho
humano não é mera filantropia; é um dever moral”. No encontro com movimentos
populares, na Bolívia, ano passado, exclamou: "Digamos sem medo. Queremos
uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema já não se aguenta, os
camponeses, trabalhadores, as comunidades e os povos tampouco o aguentam.
Tampouco o aguenta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco".
No caso
brasileiro, acrescente-se o fato de o papa conhecer a presidenta Dilma. Ele
certamente sabe que, apesar de erros na condução do governo, trata-se de uma
mulher honesta e honrada. Situação diametralmente oposta em relação às coalizões
que tocaram o “golpe brando”, formadas pelos grupos empresariais, políticos,
midiáticos, judiciários e elitistas que, historicamente, sempre se locupletaram
às custas do suor, da dor e do sacrifício dos pobres e dos trabalhadores
brasileiros. Como revelara a Esquivel, “Dilma é uma mulher honesta, denunciada
por corruptos”.
Conhecedor
da história, do sofrimento e da exclusão social dos pobres, dos trabalhadores e
das minorias nos países latino-americanos, o Papa não se omite em posicionar
contrariamente ao “golpe brando” que, articulado através de conchavos de elites
e em flagrante desrespeito ao voto popular, impõe no Brasil um governo
neoliberal e elitista, comprometido com os interesses do capital e não das
pessoas.
A Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil e o momento atual
Se por um lado o Papa Francisco tem deixado transparecer seu incômodo acerca do
golpe brando em curso, o que acontece em relação a hierarquia católica
brasileira?
Durante
o ano passado e até o mês de abril deste ano, antes do início do processo de
impedimento, a CNBB divulgou uma série de notas oficiais sobre o momento
político nacional.
Em
8 de dezembro de 2015, um comunicado do episcopado brasileiro afirmava: “neste
momento grave da vida do país, a CNBB levanta sua voz para colaborar,
fazendo chegar aos responsáveis o grito de dor desta nação atribulada, a fim de
cessarem as hostilidades e não se permitir qualquer risco de desrespeito à
ordem constitucional. Nenhuma decisão seja tomada sob o impulso da paixão
política ou ideológica. Os direitos democráticos e, sobretudo, a defesa do bem
comum do povo brasileiro devem estar acima de interesses particulares de
partidos ou de quaisquer outras corporações. É urgente resgatar a ética na
política e a paz social, através do combate à corrupção, com rigor e
imparcialidade, de acordo com os ditames da lei e as exigências da justiça”.
(Grifos nossos).
Outra
nota, de 28 de outubro de 2015, conclamava: “somos todos convocados a assegurar
a governabilidade que implica o funcionamento adequado dos três poderes,
distintos, mas harmônicos; recuperar o crescimento sustentável; diminuir as
desigualdades; exigir profundas transformações na saúde e na educação;
ampliar a infraestrutura, cuidar das populações mais vulneráveis, que são as
primeiras a sofrer com os desmandos e intransigências dos que deveriam dar o
exemplo. Cada protagonista terá que ceder em prol da construção do bem
comum, sem o que nada se obterá. É
preciso garantir o aprofundamento das conquistas sociais com vistas à
construção de uma sociedade justa e igualitária. Cabe à sociedade civil
exigir que os governantes do executivo, legislativo e judiciário recusem
terminantemente mecanismos políticos que, disfarçados de solução, aprofundam a
exclusão social e alimentam a violência, entre os quais o estado penal
seletivo, as tentativas de redução da maioridade penal, a flexibilização ou
revogação do Estatuto do Desarmamento e a transferência da demarcação de terras
indígenas para o Congresso Nacional.” (Grifos nossos).
Em
10 de março deste ano, novamente uma nota oficial da entidade pontuava:
“importante se faz reafirmar que qualquer solução que atenda à lógica do
mercado e aos interesses partidários antes que às necessidades do povo,
especialmente dos mais pobres, nega a ética e se desvia do caminho da justiça”.
(Grifos nossos).
A
última das notas sobre o momento político, datada de 13 de abril, durante a
realização da 54ª Assembleia Geral da entidade, afirmava: “a forma como se realizam as campanhas eleitorais favorece
um fisiologismo que contribui fortemente para crises como a que o país está
enfrentando neste momento. Uma das manifestações mais evidentes da crise
atual é o processo de impeachment da Presidente da República.
A Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil acompanha atentamente esse processo e espera o
correto procedimento das instâncias competentes, respeitado o ordenamento
jurídico do Estado democrático de direito. A crise atual evidencia a necessidade
de uma autêntica e profunda reforma política, que assegure efetiva
participação popular, favoreça a autonomia dos Poderes da República,
restaure a credibilidade das instituições, assegure a governabilidade e garanta
os direitos sociais.” (Grifos nossos).
Porém, sabe-se que durante essa assembleia geral, ocorrida entre
os dias 6 e 15 de abril, em Aparecida (SP), houve uma intensa discussão entre o
bispado acerca das interpretações da crise política brasileira e o processo de impeachment.
Visões e discursos diametralmente opostos fizeram do encontro, segundo fontes
extraoficiais, um dos momentos mais tensos da hierarquia católica nas últimas
décadas. Impactados com a tensão e receosos de uma quebra da colegialidade (um
arranjo político que mantém, formalmente, a unidade do episcopado nacional),
parece que a CNBB optou por um silêncio sepulcral desde então.
Não
obstante, cabe uma primeira indagação: tendo em vista os posicionamentos da
CNBB, expressos nas notas acima mencionadas, e frente às várias ações e medidas
anunciadas pelo governo interino, que implicarão em cortes nos programas
sociais (atingindo frontalmente os mais pobres), precarização do emprego e da
previdência (atingindo os trabalhadores, aposentados, beneficiários do
Benefício de Prestação Continuada e pensionistas), restrição de direitos,
criminalização de grupos e movimentos sociais, haveria uma palavra do
episcopado brasileiro em relação às medidas anunciadas pelo governo interino?
A ação política da Igreja
católica, a ampliação das bancadas evangélicas e o recrudescimento dos
discursos religiosos moralistas e fundamentalistas
É fato
que a Igreja católica tem perdido prestígio político nos últimos tempos, apesar
de se manter como instituição com grande credibilidade, conforme atestam
pesquisas sobre confiança nas instituições. Por outro lado, fala-se muito da
atuação conservadora e fundamentalista da bancada evangélica nos governos e
parlamentos. Mas, a bem da verdade, o tradicionalismo moral que tem marcado a
atuação da Frente Parlamentar Evangélica, por exemplo, só avança, em boa
medida, graças ao apoio daqueles parlamentares que se autodeclaram católicos.
Segundo
pesquisa feita pelo Portal G1, no início dessa legislatura, o catolicismo era a
religião predominante entre os 513 deputados federais. De 421 deputados que
responderam ao questionário proposto numa enquete pelo Portal, 300 (ou seja,
71,2%) se declararam católicos. Outros 68 (16%) afirmaram ser evangélicos, oito
(1,9%) disseram ser adeptos do espiritismo e apenas um deputado (0,23%) afirmou
ser judeu. Outra pesquisa, do Departamento Intersindical de Assessoria
Parlamentar (DIAP), apontou que a bancada evangélica tem 75 deputados federais
e três senadores. Portanto, cerca de 15% dos deputados são da bancada
evangélica. Significa que os outros 85% não são evangélicos. (Leia mais sobre
esse tema, aqui).
De acordo
com Magali Cunha, docente da Universidade Metodista de São Paulo - que estuda e
pesquisa a bancada evangélica -, o movimento de protagonismo dessa bancada em
direção ao conservadorismo é um capítulo recente da história do parlamento
brasileiro: “é o forte tradicionalismo moral que tem marcado a atuação da
Frente Parlamentar Evangélica, que trouxe para si o mandato da defesa da
família e da moral cristã contra a plataforma dos movimentos feministas e de
homossexuais e dos grupos de Direitos Humanos, valendo-se de alianças até mesmo
com parlamentares católicos, diálogo historicamente impensável no campo
eclesiástico”.
Em
relação à ação da Igreja católica na política institucional, atualmente os
clérigos são proibidos de exercerem mandatos políticos. Se o fizerem, devem
pedir temporariamente licença do exercício da ordem sacerdotal. A Igreja
católica estimula os chamados “leigos” a exercerem os cargos públicos nos
governos, parlamentos e partidos políticos. Porém, tal estímulo não implica
numa ação efetiva com vistas a incidir na escolha, acompanhamento e avaliação
daqueles “fiéis” que são eleitos e assumem cargos e funções públicas.
Na “vida
como ela é”, como dizia Nelson Rodrigues, sabe-se que apesar de oficialmente a
Igreja católica não apoiar partidos nem candidatos, os arranjos informais,
principalmente em períodos eleitorais, são comuns na relação entre clérigos e
candidatos de variados partidos. Os apoios de parte substantiva do clero
ocorrem de diversas formas e estratégias, desnecessárias de serem descritas
aqui.
Note-se,
também, que o discurso de isenção política da hierarquia católica acaba por
favorecer, em grande medida, uma postura descomprometida com aqueles políticos
e partidos que, tradicionalmente, são beneficiados por uma legislação
político-eleitoral altamente favorável à eleição e manutenção em cargos públicos
dos caciques partidários e das elites político-econômicas não comprometidas com
transformações sociais. Acontece, que o seguimento de Jesus Cristo, para ser
genuíno e autêntico, exige participação ativa no trabalho de transformação da
sociedade, conforme podemos observar na Doutrina Social da Igreja.
Para
complicar ainda mais, os pouquíssimos candidatos eleitos que provêm dos setores
populares e de movimentos sociais e eclesiais comprometidos com os mais pobres
e excluídos acabam abandonados pela instituição, sob o argumento segundo o qual
a Igreja não se envolve com a política partidária. O resultado dessa estratégia
é perceptível: uma miríade de políticos eleitos, autodenominados católicos,
cujas práticas nos governos e nos parlamentos são uma lástima e não
representam, nem de longe, os ideais cristãos de justiça, solidariedade,
igualdade, fraternidade, dentre outros.
O fato
objetivo é que muitos governantes e parlamentares são eleitos com votos
arregimentados em espaços eclesiais católicos. Nos governos e nos parlamentos
significativa parte desses católicos tem se aliado às bancadas evangélicas, com
interesses pouco confessáveis.
Diferentemente
das Igrejas pentecostais e neopentecostais que assumiram uma postura francamente
agressiva em relação à ocupação do poder, seja no executivo ou no parlamento,
elegendo representantes, salvo exceções, com visões de mundo e sociedade
conversadoras, machistas, moralistas e eivadas de preconceitos, a Igreja
católica insiste na tese que não se mistura com política partidária.
Paradoxalmente,
a os dirigentes católicos afirmam que a política é a arte do exercício do bem
comum, mas, na prática, passam uma mensagem dúbia, que pode levar muitos fiéis
a interpretarem a política como “coisa suja”.
Portanto,
aqui, cabe uma segunda pergunta, tendo em vista os argumentos acima: será que a
igreja católica não se envolve, mesmo, com a política institucional? Porque, e
importante lembrar que o envolvimento político se dá pela ação ou omissão; pelo
posicionamento ou não posicionamento, etc. Ou seja, ninguém, nem pessoa nem
instituição, é neutro.
Por fim,
tendo em vista as preocupações do Papa Francisco com a situação política
brasileira; o fato de o governo interino ter anunciado uma série de medidas a
penalizarem os pobres, trabalhadores, minorias e, finalmente, a postura liberal
conservadora daqueles que se autodenominam católicos no Congresso, uma última
pergunta: qual seria a mensagem da Igreja à sociedade brasileira neste momento após
o início do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff?
http://robsonsavio.blogspot.com.br/2016/06/o-papa-francisco-se-preocupa-com.html
Texto3: “A mídia, o golpe e a pseudoguerra do bem versus o mal
À medida
que o poderio econômico foi dominando a mídia, muitos “profissionais da pena”
foram se subjugando aos interesses patronais e outros se transformando em
animadores de auditório. Parte do jornalismo, ator político relevante na
formação da “opinião pública”, tem se contentado com o apequenado papel de
ventríloquo.
Presenciamos
no Brasil uma incestuosa relação no universo da comunicação de massa: de uma
maneira geral, o jornalismo domado às conveniências do grande capital sucumbe
aos ditames dos donos dos oligopólios empresariais e midiáticos que determinam
o que deve ser pautado, como, quando, de qual forma, com qual recorte e viés,
assim como o que deve ser publicado (melhor dizendo, publicizado — dado que a
produção da notícia se transformou ora em mercadoria, ora em produto de
entretenimento). Assim, o jornalismo dos grandes veículos de comunicação
decompõe-se em espetáculo, muitas vezes grotesco, a ser vendido de forma
sensacionalista, eivado de interesses de classe, para o deleite do
telespectador-consumidor desavisado.
Numa
afronta colossal ao direito humano à comunicação, as grandes redes de mídia e
as poderosas agências noticiosas escolhem, selecionam, manipulam e determinam o
que deve ser divulgado e sob qual ótica os fatos são apresentados à opinião
pública.
Há muito
se questiona a isenção e a imparcialidade dos meios de comunicação. Por um
lado, em virtude das relações imbricadas e promíscuas que envolvem os donos dos
veículos (muitos dos quais, editores de suas empresas de comunicação; outros
tantos, políticos herdeiros da velha estrutura colonial e familiar) com setores
conservadores, elitistas e golpistas; por outro, pela fragilidade de parte de
seus quadros profissionais, submissos (e impotentes) frente às determinações
patronais. Quem perde com essa situação é a democracia que deixa de ter na
imprensa o contraponto às mazelas sociais, econômicas e políticas.
Acompanhamos,
com perplexidade e surpresa, a cobertura que a mídia tem dado às denúncias de
corrupção que assolam frequentemente nossa República. A imprensa tem desprezado
o aprofundamento das informações e demonstrado discricionariedade e
seletividade na cobertura. A guerra do bem versus o
mal reproduz o velho estilo maniqueísta (uma forma de pensar simplista em que o
mundo é visto como que dividido em dois, reduzindo os fenômenos humanos e
sociais a uma relação de causa e efeito, certo e errado, isso ou aquilo; sendo
que a simplificação nasce da intolerância ou desconhecimento em relação a
verdade do outro e/ou da pressa de entender e refletir sobre a complexidade de
tais fenômenos.). Quase não se fala, por exemplo, sobre os
corruptores, os donos do capital e os interesses econômicos por detrás dos
políticos e empresários corruptos. E que a corrupção não é obra brasileira.
Trata-se de uma grande engenharia multinacional, construída para manter e fazer
funcionar o capitalismo rentista.
Somos
bombardeados com um vendaval de informações pontuais, muitas vezes
descontextualizadas, passando a (falsa) impressão, por exemplo, de que todos
são, essencialmente, corruptos e desonestos quando, na verdade, o discurso
do combate à corrupção funciona como lenitivo de salvaguarda da elite
empresarial-midiática-política, historicamente envolvida até o pescoço com os
malfeitos. Os brasileiros e brasileiras não são corruptos por essência,
como a mídia quer que acreditemos. Mas nossas elites o são. Esse é o ponto.
Essa mentira vendida como verdade (de que todos são, indistintamente,
corruptos) tem provocando um misto de histeria coletiva de caça às bruxas,
expressa na raiva, ódio e desilusão em relação ao sistema político e provocado
um imobilismo cívico – a ideia de que este país não tem conserto. Portanto,
entreguemo-lo para os ratos.
Outro
fenômeno que ressurgiu a partir das manifestações de 2013 e se recrudesceu nas
últimas eleições, em 2014, foi um misto difuso de ódio e vingança, fazendo da disputa
eleitoral uma verdadeira guerra, quando o processo democrático da escolha dos
representantes deveria ser tão e somente um embate civilizado e respeitoso de
ideias, opiniões e pontos de vista sobre os rumos do país. A quem interessa
um país no qual os cidadãos têm nojo da política?
Frente a
tanta (des)informação parece que estamos perdidos; que ninguém é honesto; que
não vale a pena lutar pela ética, a verdade, a justiça. A mensagem
subliminar seria, então, que vale a pena ser desonesto e chafurdar-se nas
pequenas corrupções do dia a dia? É essa a mensagem sub-reptícia que nos é
passada por essa mídia venal e fascista?
O pior
dos mundos é quando os cidadãos não reconhecem na ética, na verdade, na
mobilização social e na luta política os caminhos para as mudanças.
O
filósofo e cientista político esloveno Slavoj Žižek nos ajuda a
pensar algo muito importante: a unificação de todos os nossos medos (e/ou
discursos do medo) numa (falsa) verdade é o grande objetivo que sempre moveu os
ideais dos mais conservadores. Essa estratégia justificou o nazismo (os
nazistas tinham horror dos judeus, dos homossexuais...) ou o golpe
civil-militar de 1964 (medo do comunismo), por exemplo. E, agora,
justifica a assunção de uma quadrilha ao poder. Depois de transformar uma
mentira numa verdade (que somente o PT e seus quadros são corruptos), a mídia
brasileira liderou a gangue que estuprou nossa democracia. Não é mera
coincidência o fato de o sistema de justiça desdenhar os estupros reais, como o
ocorrido no Rio de Janeiro, daqueles simbólicos, não menos violentos, como o
ocorrido com nossa democracia. A justiça, enquanto sistema, não existe para
produzir justiça; senão, para corroborar os intentos e perversões dos
poderosos.
O fato, é
que a soma dos muitos medos (os verdadeiros ou aqueles construídos no
imaginário social) é o ambiente propício para se criar um clima de pânico,
instalar a desconfiança generalizada, propagandear uma insatisfação irracional.
A partir daí, pode-se construir os pseudo-heróis "salvadores da
Pátria"; justifica-se o injustificável; elegem-se os bodes expiatórios
lançando-os à fogueira, na condenação midiática para o gozo sempiterno de uma
massa amorfa, porque sempre apartada da política.
Mesmo nos
regimes ditos democráticos, a construção orquestrada do medo pelos segmentos
cujos privilégios são colocados à prova pavimenta atalhos fáceis para o
golpismo. Mas, voltemos a Žižek: a partir da unificação dos medos é
fácil acatar como verdade inequívoca o discurso do ódio, da violência, da
eliminação a qualquer custo daquele que encarna os males e seus seguidores.
Outro
problema político vergonhoso, camuflado nesse cenário, é a intolerância, o
racismo, o sectarismo religioso, o preconceito – principalmente de matrizes
étnica e socioeconômica -, o fascismo disfarçado de nacionalismo. Esses
"demônios" saíram do armário (porque lá sempre estiveram) e seus
adeptos (que comportam como massa acéfala) querem se impor, afrontando a
democracia.
Infelizmente,
alguns privilegiados de ontem e de hoje não aceitaram uma sociedade que
caminhava, a passos lentos, na construção da igualdade de fato, para além da
igualdade de direito. Querem se manter como diferentes, ostentando os velhos
privilégios da Casa Grande. Por isso, preferem morar em Miami. Não
conhecem a verdadeira história deste país, porque a conquista de direitos,
mesmo lenta e gradual, é irreversível em qualquer sociedade minimamente
democrática e plural.
A
igualdade de direitos faz parte do processo de consolidação da cidadania e é
fundamento da democracia. Não há democracia numa sociedade estamental, como
era o Brasil até bem pouco tempo. E não há democracia quando a mídia se
transforma em partido político a fomentar e dar suporte ao golpe e, agora,
transformando-se em porta-voz do governo golpista.
Texto3.1: “Ganhar as mentes e os corações e enterrar o golpe
A história recente do Brasil mostra que é preciso convencer as
mentes e amolecer os corações para que a indiferença em relação à desigualdade
e injustiça social se transforme em ação política capaz de incidir nas mudanças
institucionais.
Em 2002, Lula conseguiu convencer mentes e corações acerca da
absurda convivência com a miséria e a corrupção naturalizadas em nossa sociedade.
E foi eleito presidente. Naquele momento, o PT se tornou hegemônico na
constituição de uma coalização mudancista.
Porém, ao longo dos anos o governo petista, embriagado pela
mosca azul do poder, deixou-se contaminar, em parte, pelos maus-feitos
historicamente perpetrados pelas elites econômicas e políticas deste país. Foi
perdendo, paulatinamente, o apoio das esquerdas e daqueles segmentos
progressistas que exigem ética e coerência no trato da coisa pública.
Desde 2013, com as jornadas e junho e durante o processo
eleitoral de 2014, numa disputa real e simbólica, observamos a tomada das ruas
pelos setores mais conservadores da sociedade brasileira, nas manifestações
domingueiras promovidas pela mídia. Porém, desde o ano passado, com o
recrudescimento das disputas políticas, as esquerdas e os movimentos sociais
progressistas começaram a esboçar uma reação.
Num cenário de corrosão econômica e “endireitamento” do
Parlamento chegamos ao impensável golpe que culminou na assunção de um governo
ilegítimo de homens ricos, brancos e corruptos: uma caricatura de nossas elites
sociais, políticas e econômicas.
Ao mesmo tempo em que o PT perdia a
hegemonia da esquerda, foi-se constituindo uma ampla coalização que se concretiza,
como observamos na última manifestação deste 10 de junho, numa resposta pujante
na defesa da democracia e suas regras procedimentais e contra a superestrutura
do golpe, formada pelas elites políticas, sociais e empresariais, com apoio dos
segmentos judiciais e midiáticos.
As frentes Brasil
Popular e Povo Sem Medo foram se somando a outros segmentos sociais que, com a
assunção do governo golpista, se unem contra a agenda neoliberal, conservadora
e entreguista que tenta destruir não somente um partido político (PT) e uma
governante legitimamente eleita (Dilma), mas fundamentalmente a consolidação da
democracia e a construção de um país mais justo e igualitário.
A total ausência de notícias sobre as manifestações deste 10 de
junho na mídia golpista não sinaliza somente a má-fé dos promotores do golpe,
mas, fundamentalmente, o desespero dos setores golpistas à medida que a
empreitada conservadora vai sendo desmascarada e aumenta a mobilização social
em prol da democracia e contra o governo interino. E isso não ocorre somente no
território nacional. Temos informações de manifestações a denunciarem o golpe
em várias partes do mundo, envolvendo uma classe média progressista e diversos
campos sociais (intelectuais, artistas, militantes políticos, etc.).
As manifestações desse 10 de junho mostraram, claramente, que os
setores progressistas da sociedade começaram a ganhar os corações e as mentes
dos brasileiros. Aos poucos, todos os brasileiros e brasileiras vão percebendo
que governo provisório é péssimo para os trabalhadores, os pobres, os
aposentados, os segmentos vulneráveis e também para a classe média que, a curto
prazo, pagará o preço de uma política concentradora de riqueza e renda nas mãos
de poucos.
Precisamos mostrar que o governo golpista ataca as políticas
sociais em vez de taxar os mais ricos. É preciso demonstrar, com toda a
clareza, a farsa construída através de perversa tramoia que destituiu uma
presidenta legítima e colocou em seu lugar um gabinete cujo programa é o oposto
do que foi decidido nas urnas, em 2014. É imperioso mostrar que a presidenta
Dilma, mesmo com falhas, fez um governo sério num quadro de endireitamento do
Parlamento, aguda crise econômica e traições das mais perversas.
É claro que não estamos em 2002, mas se essa “onda” de esperança
num país de e para todos e todas continuar espraiando para dentro e fora do
Brasil teremos condições de reverter o golpe e recolocar o país nos trilhos da
democracia.
Povo nas ruas e ideias novas precisam se articular num
denominador comum da luta para reverter o golpe.
Texto3.2: “A MISÉRIA DAS ELITES BRASILEIRAS
Fonte: Facebook.
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Como naturalizar
e não problematizar a imensa injustiça provocada pelas altíssimas taxas de
juros e de spread bancário que oprimem toda uma população em favor de
meia dúzia de banqueiros e especuladores? Como entender um golpe travestido de
legalidade e abençoado pelos setores mais conservadores e retrógrados da
sociedade, com a conivência cínica de instituições que, a princípio, deferiam
se levantar contra toda afronta à Constituição ou a afronta à dignidade dos
pobres?
Jessé Souza, em sua mais recente obra A tolice da inteligência brasileira,
ou como o país se deixa manipular pela elite (São Paulo: LeYa, 2015), nos
ajuda a entender que a perfeita união entre o economicismo (“a crença explícita
ou implícita de que a variável econômica por si esclarece toda a realidade
social”) e o culturalismo conservador (uma ciência da ordem que existe para
afirmar e legitimar o mundo como ele é) justificam as leituras dominantes e
empobrecedoras do debate político brasileiro. Esse é um dos motivos do porque
não indignamos com o fato de que “nos bolsos do 1% mais rico da população
brasileira está o resultado do trabalho dos 99% restantes”. E isso parece
normal, natural, justificável, imutável e academicamente inquestionável.
Para
manter esse empreendimento vergonhoso intacto, somente com muita violência
simbólica, “que se disfarça de convencimento pelo melhor argumento”. E aqui
entra a miséria da nossa ciência. Como já ensinava Max Weber, é preciso que o
dominado socialmente se convença de sua inferioridade para que a dominação
social seja possível. Neste sentido, “a legitimação científica da dominação
fática produz a imagem de sociedades idealizadas de um lado e de sociedades
essencialmente corrompidas do outro”. Portanto, “em vez de apontar para as
causas reais da concentração da riqueza nas mãos de uns poucos e para a
exclusão da maioria, essas concepções de intelectuais servis ao poder e ao status
quo nos levam a acreditar que nossos problemas advêm da ‘corrupção apenas
do Estado’, levando a uma falsa oposição entre o Estado demonizado, tido como
corrupto, e um mercado visto como o reino de todas as virtudes”.
A bem da
verdade, as elites nacionais nunca se importaram com a consolidação de um
sistema educacional voltado aos interesses da cidadania, com o objetivo de
concretizar uma república de fato (para além da formalidade do direito).
Conviver pacificamente com essa abissal desigualdade social assistindo em berço
esplêndido e impunemente o extermínio de sessenta mil cidadãos por ano (a
maioria negros e pobres e parte significativa sendo eliminada por agentes do
estado), além de um descomunal cinismo é um dos dados mais evidentes da intensa
fragilidade de uma sociedade que nunca foi e não é nem republicana, nem
liberal-democrática e cujo Estado nunca foi e não é de direito (a não ser
na formalidade da lei que é manipulada ao bel-prazer de e para
poucos). Como dizia Darcy Ribeiro: "o Brasil tem uma classe
dominante ranzinza, azeda, medíocre, cobiçosa, que não deixa o país ir pra
frente!"
As
críticas de Jessé Souza acerca do servilismo dos intelectuais brasileiros aos
interesses dos poderosos precisam ser consideradas: “Todos os dias indivíduos
normalmente inteligentes e classes sociais inteiras são feitos de tolos para
que a reprodução de privilégios injustos seja eternizada entre nós. Para
enxergar com clareza nosso real lugar no mundo, é fundamental compreender como
nossa elite intelectual submissa à elite do dinheiro construiu uma imagem
distorcida do Brasil de modo a disfarçar todo tipo de privilégio injusto. Os
poucos que hoje controlam tudo precisam desse “exército de intelectuais”, do
mesmo modo que os coronéis do passado precisavam de seu pequeno exército de
cangaceiros. (...) E produzir “convencimento” é precisamente o trabalho de
intelectuais no mundo moderno, substituindo os padres e religiosos do passado.”
Mas, por
que o título do livro trata de uma “tolice da inteligência brasileira”?
Porque, segundo o autor, e concordamos com ele, os principais intérpretes do
Brasil sempre foram “colonizados até o osso”. Criaram suas teorias sociológicas
e políticas a partir do pressuposto de um desenvolvimento socioeconômico
relativamente baixo, como próprio das pessoas de sociedades como a nossa
e não como resultado de uma estrutura e institucionalidade de distribuição da
riqueza (acesso a bens e serviços) extremamente desiguais e excludentes.
A bem da
verdade, constata Jessé Souza, a maioria dos cientistas sociais e políticos vê
a modernidade como se fosse uma “fábula para adultos”; ou seja, a modernidade
descrita como fruto de uma benção divina. Assim, algumas sociedades abençoadas
têm pessoas boas que são recompensados (por méritos) com riquezas. Outras, não
são abençoadas e têm pessoas más, padecendo do castigo da pobreza.
Neste
sentido, no caso da tolice à brasileira, trata-se de criar todo um conjunto de
teorias com vistas a confundir a causa (desigualdade extrema associada a
“pobreza extrema”) com a consequência (reprodução crônica e ampliada das
“doenças” modernas). A partir dessa “confusão”, os tolos, que somos todos nós,
acabam vendo subjetividade, ou seja, sociedades melhores, onde na verdade
existe objetividade, isto é, sociedades estruturalmente mais ou menos
desiguais.
A leitura
atenta do livro de Jessé Souza ajuda-nos, entre outras possibilidades de
apreensão das muitas mazelas nacionais, a entender um pouco mais sobre a crise
política que vivenciamos nos últimos meses. A erosão das instituições políticas
somente confirma o que todos sabíamos, mas não queríamos reconhecer: somos uma
república das bananas, na qual, salvo exceções, as elites (políticas,
econômicas, intelectuais, religiosas e jurídicas) defendem na teoria uma
democracia formal, mas não se comprometem na concretização de numa democracia
de fato.
A ressaca
frustrante dessa democracia de faz-de-c0nta, que não respeita sequer a
formalidade dos procedimentos determinados pela Constituição Federal de 1988,
foi comprovada no golpe parlamentar-jurídico-empresarial-midiático-elitista em
curso no país. No livro, editado no ao passado, o autor já antevia no capítulo
“o golpismo de ontem e de hoje: considerações sobre o momento atual”, o que
ocorreu, de fato, neste ano.
Construtores
e patrocinadores dos contos da carochinha sobre corrupção, isenção da justiça e
deficiência do Estado, divulgados em doses cavalares pela mídia (afinal,
ninguém é dominado se não aceitar a dominação como algo bom ou devido a sua
inferioridade moral), os beneficiários diretos de uma desigualdade que se
reproduz de forma ampliada fizeram a sociedade brasileira crer que ela é
essencialmente corrupta, devendo, portanto, aceitar passivamente o estupro à
democracia apadrinhado por uma elite despudora, chafurdada na lama da
corrupção, mas com um discurso higienista, salvacionista e eivado de
conservadorismo (social, moral, político e religioso).
Os
espertos (ricos, beneficiários diretos da estrutura desigual da sociedade)
construíram uma farsa fazendo com que o brasileiro, não abençoado e corrupto
por natureza, confiasse que o âmago da corrupção está no Estado e no governo de
plantão que gerenciava a máquina pública. Como alter ego da sociedade, a
mídia ainda cumpriu o perverso papel de propagar a ideia de negação da política
(os políticos, os partidos e a democracia representativa como instituição), bem
como repudiar a importância do Estado no seu papel de fundamental como lócus de
redução da desigualdade social e suas mazelas, entre elas as violências real e
simbólica.
Tudo bem
arquitetado, assistimos ao golpe elitista reposicionando novamente para o
centro das decisões do Estado aquele 1% mais rico, que controla a riqueza e o
poder; que tem nas mãos todo o sistema de manipulação da opinião publicada
transformada em opinião pública; que tem no sistema de justiça
conservador e seletivo parceiro de primeira hora; que não paga imposto
(porque no Brasil os lucros de capital são isentos de tributos) e que,
historicamente, sempre usurpou do trabalho e do suor dos 99% dos brasileiros,
principalmente dos 70% dos trabalhadores e empobrecidos. E todos, como
marionetes, assistimos ao espetáculo sem perceber que os mesmos de sempre
pagarão a conta do banquete dos poderosos.
http://robsonsavio.blogspot.com.br/2016/06/a-miseria-das-elites-brasileiras.html
A involução social, política, moral e ética de um governo ilegítimo
Não é
preciso esperar um mês, sequer uma semana, para fazer uma avaliação do governo
ilegítimo. Cinco horas depois da notificação pelo Senado, o presidente interino
deixou claro seu compromisso com a dilapidação das políticas e das instituições
de proteção e garantia de direitos, de proteção social e de combate à corrupção.
A
composição ministerial do novo governo chega a ser uma afronta inominável à
população brasileira: um time composto por 100% de homens brancos, 78%
milionários, 31% donos de rádio e TV, 31% citados na Operação Lava Jato mostra
a que veio o coronel da velha república. Ao escolher como lema “ordem e
progresso” (os ideais de Benjamin Constant e dos fundadores da república de e
para poucos - fazendeiros, ilustrados positivistas, maçons e militares), o
governo ilegítimo deixa claro que a ordem burguesa conservadora, elitista e
opressora prevalecerá de agora em diante, lançando o país no século 19. Ordem
burguesa, para ficar claro, é aquela estrutura policial-judicial-estatal que,
em nome da lei, sufoca, reprime e, no limite, elimina todo o opositor. Não é à
toa que os pitbulls globais, por exemplo, já vomitam nos noticiários da
emissora oficial do golpe expressões do tipo “desordeiros” ou “baderneiros” (em
relação aos movimentos sociais e manifestações contra o governo) para
justificar a repressão.
No campo dos direitos humanos, quero sublinhar, tivemos uma regressão de quase
meio século. Desde 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
assistimos no mundo inteiro uma ampliação das políticas públicas de defesa,
garantia, proteção e promoção de direitos. No Brasil, mesmo que tardiamente,
desde o governo Sarney, passando pela Constituição Federal de 1988, depois no
governo FHC (com a criação de órgãos, programas, projetos e políticas de
direitos humanos) e a ampliação e consolidação dessas políticas nos governos
Lula e Dilma, tivemos a construção de uma sólida política de estado de direitos
humanos. Agora, ruborizados de vergonha, assistimos, numa canetada e de forma
violenta, a extinção dos ministérios da Igualdade Racial, das Mulheres, da
Juventude, dos Direitos humanos. Na prática, um colossal retrocesso em relação
aos direitos de mulheres, jovens e negros, e mais especificamente, dos
quilombolas, povos de matriz africana, povos e comunidades tradicionais,
população LGBT, grupos vítimas de tráfico de pessoas e tortura, entre outros.
Chama a
atenção o fato de se localizar justamente no Ministério da Justiça o novo órgão
que cuidará desses temas. O atual titular da pasta da justiça (?), que era
secretário de segurança de São Paulo, autorizou a invasão das escolas e a
prisão de adolescentes que as ocupavam, protestando contra a máfia da merenda.
Além disso, já foi advogado de Eduardo Cunha, o inominável, e do
PCC (Primeiro Comando da Capital) (veja aqui).
Recentemente, disse à imprensa que determinadas manifestações populares são
atos de guerrilha (veja aqui). Será mera coincidência essa estreita relação
do novo governo com o governo Alckmin? Seria uma prévia do projeto dos
tucanos com os peemedebistas para 2018?
É bom
lembramos, aqui, Hannah Arendt: primeiro, a violência destitui a fala, no caso,
das minorias. Depois, vêm todas as outras formas de domínio e de opressão.
Esses grupos historicamente invisibilizados e vulnerabilizados da sociedade
brasileira passam, de agora em diante, a serem definitivamente excluídos e
extirpados do estado (não-democrático de direita).
Como se
não bastassem tantos retrocessos e violências contra uma sociedade plural,
desigual e diversificada, o governo ilegítimo fundiu os ministérios da Educação
e da Cultura, colocando em seu comando um político do DEM que é a favor do
rebaixamento da idade penal e que tem questionado, repetidas vezes, políticas
de ampliação da educação pública, de ações afirmativas e de alargamento do
acesso à universidade pública. Também aqui há uma visão do século 19, que
sustenta o perverso argumento segundo o qual as universidades públicas devem
ser centros de formação da elite dirigente do país.
Na
biografia do titular da educação consta ainda o fato de ele ter fortes relações
com o instituto que cedeu ao governo tucano de São Paulo o projeto de
reestruturação das escolas, ocasionando uma forte e cívica reação dos
estudantes que passaram a ocupá-las, primeiro denunciando esse projeto; depois
pelo roubo da merenda naquele estado (veja aqui).
Em relação
a violência contra os trabalhadores e as trabalhadoras deste país, a
transformação do Ministério do Trabalho e Previdência Social em Ministério do
Trabalho e o fato de a Previdência passar a ser uma mera atribuição do ministro
da Fazenda, com o compromisso explícito de realizar uma ampla reforma
(alterando a idade mínima para aposentadoria, desvinculando o salário mínimo do
reajuste das aposentadorias e possivelmente privatizando a Previdência) mostra
claramente o desdém do governo ilegítimo para com a classe trabalhadora. O
ministro da fazenda, que recuso citar seu nome, teve a desfaçatez de afirmar
que “direitos adquiridos é um conceito impreciso” (veja aqui),
não restando dúvida que o feitor dos trabalhadores não poupará sequer os
direitos previdenciários já adquiridos.
E tem
mais: a extinção da Controladoria-Geral da União (CGU), o órgão responsável nos
últimos anos pelo sistemático combate e desmonte da corrupção na máquina
pública federal (sendo mais eficiente que as estruturas seletivas do judiciário
e ministério público nessa área), foi extinta em ataque frontal ao direito de
acesso à informação e limitação do combate à corrupção. Sua extinção e
substituição pelo Ministério de Transparência, Fiscalização e Controle, esse
pomposo nome que não significa nada na prática, retira autonomia do órgão
(fundamental para um enfrentamento eficiente da corrupção). Ademais, trata-se
de uma afronta à doutrina internacional do controle interno que determina que
mecanismos de controle estejam diretamente vinculados à Presidência da
República. Não precisa escrever mais sobre isso. O fato de o presidente ilegítimo
e sete de seus ministros estarem envolvidos em diversas denúncias de corrupção
sugere que há algo muito estranho e oculto no aparente reino dos que tomaram o
poder sem ter votos. A cegueira da justiça em relação a esse e outros fatos
mostra que a degradação dos poderes não se limita no executivo e no legislativo.
A questão
agrária e rural será, agora, uma espécie de “puxadinho” do Ministério de
Desenvolvimento Social. Sob o comando de um peemedebista gaúcho, a ordem é
fortalecer o “empreendedorismo rural”. Quantas palavras bonitas “pra inglês
ver”, bem nos moldes positivistas da velha república. Provavelmente, doravante
ocorrerão ações sistemáticas para desmontar o que foi criado visando o
fortalecimento e a autonomia dos agricultores familiares, camponeses e
indígenas que garantem mais de 70% dos alimentos que os brasileiros consomem.
De agora em diante, no governo dos coronéis, esses segmentos do campo passam a
ser tratados como pobres coitados e não mais como importantes atores do
desenvolvimento socioeconômico e ambiental do país.
Por fim,
a violência real e simbólica praticada contra a presidenta Dilma (uma mulher
que é bela, recatada, do lar, da luta, da democracia e com mãos limpas) virou
escândalo na comunidade internacional. Nenhum chefe de estado e de governo
apareceu para defender o governo ilegítimo. Ao contrário, as notícias que temos
de várias fontes, obviamente não da imprensa golpista, é que o constrangimento
é geral. Até mesmo liberais democratas de variados países que, apesar de serem
serviçais do mercado são respeitadores da lei, andam atordoados com as notícias
do Brasil. Um vexame sem fim...
É
preciso, neste momento, dizer algo mais: instituições e pessoas que se dizem
defensores da democracia e se calam frente a tanta violência precisam sair da
toca (do comodismo, do medo ou da paralisia decisória). Afinal, como diz o
velho ditado popular, geralmente, “quem cala consente”.
Com
racionalidade, alguma serenidade e estudando um pouco da história e da política
brasileiras, consigo compreender claramente os processos de conquista do poder
pelas elites desse país. Historicamente, são inúmeros os exemplos que mostram
que esses grupos poderosos (ora com a cruz e a espada; ou com a chibata; ou com
as armas e canhões e, agora, com a ajuda do parlamento, da mídia e da justiça)
se impõem pela força, contra o povo e o projeto de uma nação, das mais variadas
formas. Por isso, o sentimento não é de ódio no coração, nem confusão na mente.
Sinto-me triste, envergonhado e angustiado frente à imensa involução social,
política, moral e ética de um governo ilegítimo. Por isso, não reconheço um
governo golpista.
Impeachment: a farsa do jogo jogado
Assistiremos hoje a mais uma congressada,
desta vez urdida pelo Senado Federal, levando os usurpadores, que não passaram
pelo crivo das urnas e, portanto, não têm mandato popular para o Palácio do
Planalto. Para dar ares de seriedade, os senadores (em sua maioria brancos e
ricos e muitos com pendências judiciais) não repetirão a palhaçada da sessão da
Câmara. Porém, por mais que escondam, não deixarão de explicitar a farsa de um
processo cuja ré é julgada sem ter praticado crime. A farsa do jogo jogado
que começou com a não aceitação de Aécio do resultado das urnas tem seu
pseudocoroamento no dia de hoje.
Ao longo de um ano, sob a batuta
de Janot, Moro, da Polícia Federal e da mídia chafurdaram a vida e as ações de
Dilma tentando encontrar um crime de responsabilidade. Como não tiveram êxito,
inventaram essa desculpa esfarrapada das pedaladas fiscais para justificarem a
empreitada golpista.
As duas coalizões golpistas
(veja aqui)
conseguiram apear do poder uma presidenta eleita democraticamente e impedida de
exercer seu mandato, numa afronta abissal à Constituição. Porém, o resultado
desse estupro à democracia virá em doses cavalares nos próximos dias e anos.
Ter esperança na justiça é
evidente perda de tempo. Se o STF desejasse um mínimo de moralidade na
República deveria ter determinado não somente o afastamento de Eduardo Cunha do
seu mandato e da presidência da Câmara, mas também anulado todos os seus atos
desde o recebimento da denúncia da PGR em dezembro de 2015. E, nesses atos,
estaria inclusa a patética sessão da Câmara de 17 de abril quando foi
determinado o prosseguimento do processo de impeachment contra
Dilma Rousseff. Como dizia Ruy Barbosa "a justiça
atrasada não é justiça; senão injustiça qualificada e manifesta." (IN:
"Oração aos Moços", 1921).
Depois de apresentar um
relatório eivado de vícios, o tucano Antônio Anastasia (PSDB), assistiu seu
parecer na Comissão daquela Casa ser desconstruído publicamente
pelos três juristas citados por ele no documento. Os constitucionalistas Lenio
Luiz Streck, Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira e Alexandre
Bahia aparecem na peça de Anastasia como se reforçando o ponto de
vista do relator.
Num embate entre Anastasia
e o advogado geral da União José Eduardo Cardoso, durante uma das
oitivas na Comissão do Impeachment do Senado, o mineiro quis,
espertamente, dar ares de legalidade a trama golpista, sendo confrontado
imediatamente pelo defensor de Dilma Rousseff:
“O fato de existir direito
de defesa formal, não real, onde as pessoas já entram com a convicção formada,
indica uma decisão política e não uma decisão imparcial. O senhor (Anastasia)
diz que nunca viu golpe com direito de defesa? Eu já vi. Eu já vi injustiça com
direito de defesa. Todos os julgamentos mais iníquos da humanidade foram feitos
com direito de defesa. Aliás, quando se quer esconder uma iniquidade, se dá o
direito de defesa retórico onde as cartas já estão marcadas, onde o jogo já
está definido”. (José Eduardo Cardozo – veja aqui).
A destruição da democracia
terá um preço colossal. Conforme
as palavras proferidas pelo insuspeito professor Paulo Sérgio Pinheiro,
integrante do governo FHC e reconhecido internacionalmente pela defesa dos
direitos humanos,
“o que vai acontecer é a derrubada de tudo o que se
constituiu nos últimos 25 anos em termos de direitos humanos, controle civil
das Forças Armadas, fortalecimento dos movimentos sociais e da sociedade civil
democrática organizada”. “O perfil do governo golpista simplesmente é um sinal
fraco do governo, com práticas de direita e extrema direita, que estarão ainda
por vir” (veja aqui).
O respeitado cientista
político Wanderley Guilherme dos Santos, em uma rede social, postou
ontem (10/05) uma análise corajosa, típica daqueles que não têm medo em
desvelar a trama cujos resultados ainda não conhecemos e que precisa ser
reproduzida, quase que na íntegra, aqui:
“Qualquer objeção jurídica ou lógica à decisão é pura
perda de tempo. Por isso o golpe fracassou. As sucessivas ilegalidades da
força-tarefa da Lava-Jato, com prisões injustificadas, humilhações de
investigados, difamações, tortura psicológica de presos, vazamentos operados
com oportunismo, incansável repetição de incriminação e degradação de
investigados ou mesmo réus em curso de julgamento, linguagem virulenta de
procuradores, policiais federais e Procurador-Geral da República, cultivando
hostilidade e ódio na opinião pública e, finalmente, o apelo dos homiziados de
Curitiba aos movimentos sociais conservadores e mídia golpista para continuado
apoio, esquecendo as instâncias judiciárias e de outros poderes a que estão
subordinados, substituiu a indumentária de cavaleiros pelo restabelecimento da
moralidade pelo descarado uso da força bruta, e só ela, contida nas leis. Não
há salvação: Michel Temer é um usurpador e seu governo não deve ser obedecido.
Não deve e não o será. O golpe fracassou
socialmente e o usurpador só governará mediante violência física, repressão sem
disfarce. Ou a sublevação social pela democracia é submetida pela força (e aí o
golpe, finalmente, será vitorioso), ou a coerção servirá de combustível à
sublevação. Então, de duas uma: ou Michel Temer renuncia e o STF convoca novas
eleições ou as forças armadas intervirão. ”
Postado há 11th
May por Robson Sávio Reis Souza
A MÍDIA, OS RICOS, OS ROUBOS E NOSSA VELHA ORDEM SEMIESCRAVOCRATA
A GLOBO (e os demais veículos do
conglomerado midiático brasileiro) SÃO PODRES. Vejam como atuam com os dois
pesos e duas medidas:
1. Neymar da Silva Santos
Júnior e seu pai são acusados de sonegação fiscal e evasão de divisas
no Brasil e na Europa.
Sejamos claros:
corrupção no futebol (cartolas, jogadores e empresários) é coisa corriqueira
nessas plagas. Só não vê quem não quer. E, dispensam-se outros comentários...
Em
entrevista exibida aos quatro ventos na Globo (que pauta os demais veículos da
mídia da Casa Grande), pai e filho, os heróis globais brasileiros, retrucam as
denúncias e apontam para o promotor brasileiro, acusando-o de arbitrariedade.
ESTÃO INDIGNADOS!!!
Obviamente,
ninguém deve julgar o garoto-propaganda global antecipadamente. Porém, é muito
estranho a produção do álibi pela emissora platinada antes do processamento da
denúncia. Seria uma forma de chantagear a justiça - prática feita com perfeição
e perversão pela mídia?
E, mais:
a Globo opera dessa forma com todas as “personalidades” acusadas pelo MP?
2. DIFERENTEMENTE, quando
se trata, por exemplo, de Lula, sua esposa e filhos, a mídia, encabeçada pela
Globo, Folha, Estadão e uma revista de fofoca que recuso mencionar aqui
produzem uma enxurrada de notícias e comentários afirmando que eventuais
investigações de promotores, delegados e similares - que sempre têm
espaço para denunciarem a torto e a direito mesmo sem a produção de provas
- como SENTENÇA TRANSITADA E JULGADA. Muito raramente, desmentidos são
produzidos em notinhas de rodapé.
A caçada àquele que é uma ameaça
real, apesar de todas as suas incoerências, aos anseios das castas tupiniquins
produz uma inquisição midiática à brasileira em pleno século 21.
Ninguém deveria estar acima da
lei. E nem abaixo dela. Se a justiça operasse de fato e de direito, limites a
ação dos folhetim-torquemadas deveria ocorrer: ou para pôr freios à execração
pública de um cidadão, que também é ex-presidente, ou para processar as mesmas
investigações de todos os ex-presidentes que têm pesadas acusações de desmandos
durante seus governos, da mesma forma.
Há uma revista nacional, cujo
patrono é Paul Joseph Goebbels, o Ministro
da Propaganda do Reich na Alemanha Nazi de 1933 a 1945, que há mais de
30 anos produz semanalmente acusações sem provas... impunemente.
NO BRASIL, VIA DE REGRA, OS RICOS
SEMPRE CONSTRUÍRAM SUAS FORTUNAS VIA SONEGAÇÃO FISCAL E ESPOLIAÇÃO DA COISA
PÚBLICA: DESDE AS CAPITANIAS HEREDITÁRIAS, PASSANDO PELO REGIME ESCRAVOCRATA E
AS BENESSES ADVINDAS COM A REPÚBLICA A MANTER PRIVILÉGIOS PARA UNS POUCOS.
ASSIM, SE FORMARAM AS GRANDES
FORTUNAS NACIONAIS E TAMBÉM UMA PARTE DA RIQUEZA DA CLASSE MÉDIA: VIA
SONEGAÇÃO, GRILAGEM DE TERRA, CORRUPÇÃO GENERALIZADA NO ESPAÇO PÚBLICO, EVASÃO
FISCAL, ETC...
MAS ESSE REGIME
INSTITUCIONALIZADO DE SAQUE AO ERÁRIO SÓ É PERMITIDO AOS CONFRADES.
COMO FAZEM PARA
INSTITUCIONALIZÁ-LO? PRIMEIRO, PRODUZEM AS LEIS: PORQUE O PODER LEGISLATIVO NO
BRASIL SEMPRE FOI TERRA DOS PODEROSOS (PROPRIETÁRIOS DE TERRA, PROFISSIONAIS
LIBERAIS, EMPRESÁRIOS). O EXECUTIVO, VIA DE REGRA, TRANSFORMOU-SE NA FEITORIA
DO RICOS. E, POR FIM, REGULAMENTADO O ROUBO E O FURTO DO ERÁRIO PARA DOS RICOS,
O PODER JUDICIÁRIO OPERA A GARANTIR SEUS PRIVILÉGIOS. Todos a serviço do
capitalismo, sustentado pela "política da lei e da ordem", dos
governos de direita e esquerda... a punir aqueles que contradizem essa ordem
semiescravocrata. Exagero? Vejam a vida de um(a) trabalhador(a): acorda cinco
da manhã, pega um busão lotado, trabalha o dia todo, gasta duas horas para
chegar de volta em casa no mesmo busão, etc... etc. E ganha menos de 900 reais.
Tá com inveja?
Ou seja, estado penal para os pobres; estado constitucional para os ricos.
Ou seja, estado penal para os pobres; estado constitucional para os ricos.
Pela primeira vez na história
desse país, uma legislação, de 2013, passou a punir as
empresas que participam de atos de corrupção envolvendo a administração
pública. Sancionada em agosto, a lei 12.846 responsabiliza
administrativa e civilmente as empresas que se envolverem em episódios de
corrupção.
É por isso que alguns tubarões
andam visitando as instalações da PF, nos últimos anos.
Por que isso não ocorreu anteriormente? Culpa da Dilma e do PT ?
Por que isso não ocorreu anteriormente? Culpa da Dilma e do PT ?
Se já tivéssemos uma lei assim há muito tempo, o que
estaria acontecendo com a Globo no caso do processo sumido de sua sonegação
fiscal, pelo qual só pagou, até agora, uma servidora modesta da Receita
Federal?
http://robsonsavio.blogspot.com.br/2016/02/a-midia-os-ricos-os-roubos-e-nossa.html