A constituinte exclusiva
pode, em tese, ocorrer por vários meios jurídicos.
Mas a assembleia
constituinte exclusiva da reforma política teria duas grandes delimitações:
seria convocada com mandato específico para essa tarefa, encerrando após seu
término, e composta por representantes eleitos apenas para esse fim.
Se irá ou
não ocorrer, dependerá da capacidade das forças sociais e populares que a
defendem acumular, democraticamente, os recursos de poder necessários para
afirmar, com legitimidade, sua vontade política
Um espectro assombra os interesses e a
consciência política dos conservadores: a proposta de realização de um
plebiscito popular, constitucionalmente respaldado, para que os eleitores
expressem soberanamente se querem ou não que uma assembleia constituinte
exclusiva faça a reforma política.
Essa proposta, como se sabe, foi feita em
junho de 2013 pela presidenta Dilma Rousseff, em resposta às grandes
manifestações de rua então em curso, nas quais, entre outros, os manifestantes
queixavam-se, para dizer o mínimo, do sistema político.
Diante da enorme
dificuldade de sua aprovação no Congresso Nacional, Dilma propôs que o povo,
soberano, se posicionasse. Imediatamente, abriu-se uma polêmica jurídica e
política em torno da proposta. Afinal, é possível, em tese, uma constituinte
exclusiva para a reforma política? A resposta é positiva, embora haja também
quem prefira a negativa.
Essa contradição significa que o problema não é
exclusivamente de técnica jurídica apartada da política, pois, nessa seara,
ilustres constitucionalistas divergem sobre a proposta de Dilma. Por exemplo:
Ives Gandra Martins é a favor e Paulo Bonavides, contra.
A divergência expressa
a natureza política ou sociopolítica do Direito, que tanto torna complexa a
hermenêutica jurídica, em especial a constitucional, sendo a Constituição um
texto político por excelência.
A sociedade humana, construída incessantemente
pelo aristotélico zoon politikon (animal social), tem no direito uma das bases
de conformação da polis, ou seja, do Estado.
A clássica definição que Max Weber
dá ao Estado é simultaneamente política e jurídica: “Aquela comunidade humana
que, dentro de determinado território [...] reclama para si (com êxito) o
monopólio da coação física legítima”.Se o que define a política é o meio
próprio que a caracteriza, a força, e não seus fins, que podem variar, ao
atribuir ao Estado a pretensão de exercer o monopólio da coação legítima, Weber
está mobilizando uma noção cara tanto ao direito quanto à política: a
legitimidade.
Assim o fazendo, ilumina tanto o caráter político do direito como
o caráter jurídico do Estado, instituição máxima da política. Antes de Weber,
Marx já havia qualificado o Estado como uma superestrutura jurídico-política.
Em uma análise realista, e não normativa, o que vai definir se a constituinte
exclusiva é ou não legítima e viável será a competição política democrática.
As
ideias jurídicas, políticas ou sociológicas e o arcabouço jurídico efetivamente
existente também entram na disputa, são mobilizados e apropriados pelos atores
para dar fundamentação intelectual a seus interesses e propósitos, em especial
quando fluem livremente em regime democrático, como é o caso do Brasil atual.
Mas as lutas políticas, mesmo em regime democrático, podem também desembocar em
autoritarismo. As forças que promoveram o golpe de Estado de 1964 rasgaram a
Constituição de 1946 por terem tido recursos políticos e militares para
fazê-lo, opondo-se assim às demandas reformistas dos atores sociais de então.
Não estou, de maneira nenhuma, defendendo o vale-tudo político e negando Weber
para considerar que toda força seja legítima, o que não é verdade.
Em termos
normativos, sou democrata, mais exatamente, socialista democrático, mas, na
disputa política dos atores com recursos de poder, os valores incorporam-se às
forças sociais efetivamente em ação, que, devido à estrutura de classes e a
outros motivos de estratificação e diferenciação, possuem visões diferentes
sobre política, democracia, autoritarismo, direito, norma jurídica,
legitimidade, soberania popular, participação etc.
As próprias constituintes e
revisões constitucionais surgem ou deixam de surgir lastreadas no efetivo
processo histórico das lutas entre as classes, frações, partidos, grupos de
interesse etc. por seus respectivos objetivos.
E as ideias, obviamente, sempre
se fazem presentes, pois os homens pensam. - http://www.teoriaedebate.org.br/materias/nacional/o-que-e-constituinte-exclusiva-da-reforma-politica
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