Com este artigo do
professor Alexandre Barbosa Pereira, uma das boas leituras e reflexões que se poder fazer nesse agosto,
o PT são-sebastiãoense homenageia a vocês, juventudes, deste Município, Estado
e Brasil, nessa data.
Então, feliz Dia da Estudanta
e do Estudante!.
Com juventudes, o
antropólogo buscar demonstrar a importância de compreender as muitas diversidades
de cada faixa etária e de cada período histórico.
Boa leitura e reflexões e que nessas eleições cada de nós reflita muito bem sobre os ontens, hojes e futuros, de nós e semelhantes
“A juventude não existe de forma isolada. É preciso
pensá-la em contraposição e em relação às outras faixas etárias e gerações e
contextualizá-la socialmente. As
juventudes apresentam elementos comuns e de diferenciação. Atentar para esses
aspectos pode ser crucial para discutir as políticas públicas voltadas para
esse segmento e, talvez o principal, problematizar as especificidades do papel
da instituição escolar no mundo atual.
Diversidade das juventudes é fundamental para gerar
política públicas amplas. Fotos: José Cruz/ABr
Discutir a juventude na contemporaneidade leva-nos
a tomar duas precauções importantes: entender que a noção de juventude é uma
construção social e cultural e, além disso, bastante diversificada; e
compreender que a noção de juventude não pode ser definida isoladamente, mas a
partir de suas múltiplas relações e contextos sociais.
Nesse sentido, pensar a ideia de juventude é pensar
sobre condições de gênero, raça, classe social, moradia e pertencimento
religioso. E, o principal, contextualizá-la historicamente, como integrante de
uma geração específica que se relaciona com outras gerações. Por isso, como já
tem sido bastante reiterado pelos especialistas, não é possível falar no jovem
atual, mas nos diferentes modos de vivenciar a juventude na contemporaneidade.
“A ‘juventude’ é apenas uma palavra”, afirma
Bourdieu, ao abordar a noção de juventude. Para ele, as divisões entre as
idades seriam arbitrárias: “Somos sempre o jovem ou o velho de alguém”. Sendo
assim, os cortes, em classes de idade ou em gerações, teriam uma variação
interna e seriam objeto de manipulação. Portanto, juventude e velhice não
seriam dados, mas construções sociais oriundas da luta entre os jovens e os
velhos. Dessa maneira, as relações entre idade biológica e social seriam muito
complexas. Pode-se apreender, portanto, que tal noção configuraria um elemento
que faz sentindo somente no contraste entre os mais novos e os mais velhos.
Entretanto, para outros autores estudiosos da
juventude e de suas práticas, seria mais que uma palavra. Em texto cujo título
já apresenta um contraponto a Bourdieu – “A juventude é mais que uma palavra”
–, Mario Margulis e Marcelo Urresti propõem a superação de considerações sobre
a juventude como mera categorização por idade, com características uniformes:
“A condição histórico-cultural de juventude não se oferece de igual forma para
todos os integrantes da categoria estatística jovem” (tradução minha).
Para eles, a discussão feita por Bourdieu leva à percepção da juventude como
“mero signo”, como “uma construção cultural desgarrada de outras condições”.
Assim, a noção, como definida por Bourdieu, é desvinculada de seus
condicionantes históricos e materiais.
Os dois autores reforçam a necessidade de atentar
para o modo como a condição de juventude manifesta-se de forma desigual
conforme outros fatores, como classe social e/ou gênero. Não se constitui,
portanto, um conceito unívoco. Contudo, ressaltam que assim como não se deve
considerar apenas os critérios biológicos de idade para definir juventude, não
se pode também levar em conta apenas os critérios sociais.
Para se pensar as peculiaridades da juventude em
relação às outras gerações e mesmo às especificidades internas aos diversos
modos de vivenciá-la, os dois autores trabalharam com as noções de moratória
social e moratória vital. Inspiraram-se na discussão feita por Erik
Erikson, cuja ideia de moratória, entendida como um período de suspensão de
obrigações e responsabilidades, é defendida como elemento importante para
permitir aos jovens fazer suas escolhas e experimentar o mundo.
Segundo Margulis e Urresti, a partir dos séculos 18
e 19 a juventude, como uma etapa da vida, passou a ser vista também como uma
camada que detém certos privilégios. Constituiria, então, um período, antes da
maturidade biológica e social, marcado por uma maior permissividade,
configurando, dessa forma, a moratória social do qual desfrutam alguns jovens
privilegiados por pertencer a setores sociais mais favorecidos. Para os que têm
tal privilégio, o ingresso na vida adulta, com as exigências requeridas para a
entrada na maturidade social, é cada vez mais postergado pelo aumento do tempo
de estudo.
Dessa forma, os jovens das camadas populares,
devido, entre outras coisas, ao ingresso prematuro no mercado de trabalho e à
assunção de obrigações familiares (casamento, filhos etc.) em idade reduzida,
teriam sua moratória social diminuída e, por consequência, uma vivência juvenil
diversa da dos mais abastados. Os jovens das classes populares “carecem de
tempo e dinheiro – moratória social – para viver um período mais ou
menos prolongado de relativa despreocupação” (tradução minha).
Por outro lado, Margulis e Urresti apontam ainda a
existência de uma moratória que consideram complementar à social: a moratória
vital. Um período da vida em que se possui um excedente temporal, um
crédito, algo que se tem economizado. Um elemento que se tem a mais e do qual
se pode dispor que os não jovens teriam mais reduzido: um certo “capital temporal”
ou “capital energético”.
“Daí a sensação de invulnerabilidade que
caracteriza os jovens, sua sensação de segurança: a morte está longe, é
inverossímil, pertence ao mundo dos outros, às gerações que os precederam”
(tradução minha). E sobre essa moratória também aparecerão as diferenças
sociais e culturais, de classe e/ou de gênero no modo de ser jovem.
Haveria, no entanto, a ênfase de alguns enfoques
sobre a temática da juventude apenas na moratória social, que, por isso,
tenderia a restringir a condição de juventude aos setores médios e altos. Isso
porque se ocultaria ou se esqueceria este outro lado, definido como moratória
vital, comum a todas as classes. Para esses dois autores, a moratória
social definiria então uma certa noção de juvenil que se expressaria por
certos aspectos estéticos e configuraria um certo privilégio de determinadas
classes sociais mais abastadas.
Já a moratória vital definiria uma noção
fática de ser jovem comum a todas as classes sociais, marcada pela energia do
corpo e pela distância da morte. Com isso, ressaltam a especificidade de classe
nas definições do que é ser jovem. Há classes nas gerações, assim como há
gerações nas classes. Contudo, ressaltam igualmente a especificidade de gênero
na definição de juventude: “A juventude depende também do gênero, do corpo
processado pela sociedade e pela cultura; a condição de juventude se oferece de
maneira diferente para o homem e a mulher” (tradução minha).
Há que salientar ainda o que talvez seja o caráter
mais importante da definição da juventude na contemporaneidade: sua
supervalorização. Ser jovem, hoje, é um dos maiores desejos. E ser jovem
implica modificar o corpo numa tentativa de retardar o envelhecimento, mas
também tentar desfrutar um estilo juvenil, marcado pelo consumo de determinados
bens materiais e simbólicos.
Ocorre, assim, a extensão do que seria a faixa
etária entendida como jovem, tanto para cima quanto para baixo: as crianças se
tornariam jovens ou adolescentes cada vez mais cedo e os jovens adultos
envelheceriam cada vez mais tarde. Já é fenômeno bastante estudado no contexto
europeu o adiamento da saída da casa dos pais, por exemplo.
Acontece, entretanto, que mesmo esse fenômeno não
pode ser generalizado, pois não é possível apreender a ideia de juventude de
forma isolada. É preciso, por um lado, como afirma Bourdieu, pensá-la, ao mesmo
tempo, em contraposição e em relação às outras faixas etárias e gerações e, por
outro, contextualizá-la socialmente.
As juventudes, portanto, apresentam elementos
comuns e de diferenciação. Atentar para esses aspectos pode ser crucial para
discutir as políticas públicas voltadas para esse segmento e, talvez o
principal, problematizar as especificidades do papel da instituição escolar no
mundo atual.
>Alexandre Barbosa Pereira é doutor em Antropologia Social
Referências
BOURDIEU,
Pierre. “A juventude é apenas uma palavra”. In: Questões de Sociologia.
Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983, p. 113.
ERIKSON, Erik.
Identity: Youth and Crisis. New York: Norton, 1968.
MARGULIS, Mario
(org.). La Cultura de la Noche: La Vida Nocturna de los Jóvenes en Buenos
Aires. Buenos Aires: Espasa Calpe, 1994.
MARGULIS, Mario;
URRESTI, Marcelo. “La juventud es más que una palabra”. In: Margulis, M.
(org.). La juventud es Más Que una Palabra. Buenos Aires: Biblos, 1996,
p. 25.
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